Este boletim sintetiza os pontos destacados pelo Professor Phillip Dawson (Centre for Research in Assessment and Digital Learning – CRADLE) Deakin University, Melbourne, Austrália, no Webinar sobre confiança na avaliação online e formas de prevenção da fraude, realizado no âmbito da 3ª edição das Jornadas Interinstitucionais de Desenvolvimento Pedagógico.
As 3 ideias, as 3 mensagens principais (abaixo sintetizam-se orientações para cada ideia):
É necessário equilibrar o princípio da promoção e da valorização da integridade académica com os processos que garantem a segurança da avaliação e dos seus resultados;
Nenhum design de avaliação é, por si próprio, suficiente para garantir a integridade da avaliação;
É necessária a definição de uma política institucional sobre o que são os padrões aceitáveis de integridade.
Definição de e-cheating (fraude digital) [1] Engloba qualquer processo fraudulento que recorra a recursos ou tecnologias digitais. Inclui os processos designados de “contract cheating” que consistem no pagamento a terceiros para a realização de trabalhos académicos. É importante reconhecer que o e-cheating é aliciado em permanência na internet e nas redes sociais. A fraude digital pode ser uma forma de expressão de questões sociais de maior abrangência.
Orientações #1: O equilíbrio entre a promoção da integridade académica e o recurso a processos que contribuam para garantir a segurança da avaliação [2]
Não existe uma solução única e simples para eliminar a fraude. A internet permite o acesso fácil a um vasto conjunto de serviços e de aplicações para cometer fraude em todo o tipo de tarefas. A implementação de restrições severas ou o recurso a tecnologias de vigilância contribuem para a mitigação da fraude mas não a anulam por si próprias. A promoção de integridade (ex: campanhas, formação de docentes e de estudantes …) e a implementação de procedimentos de segurança (ex: vigilância remota) não são processos a considerar em alternativa, ambos são necessários.
Integridade Académica | Segurança da avaliação | Sugestões |
É um valor e uma característica de cada indivíduo, mais do que a forma como age. É promovida em orientações e iniciativas institucionais. | São as medidas que se implementam para contrariar as tentativas de realização de fraude, dificultando-as; são em regra punitivas e baseadas em provas. | Ambicionar o equilíbrio; dificultar a fraude implica aplicar medidas proactivas de prevenção da fraude e de garantia de segurança dos processos; evitar a polarização do discurso em qualquer dos sentidos. |
Recomendação adicionais no International Center for Academic Integrity (ICAI) [3], um Centro de referência dedicado ao desenvolvimento, a nível mundial, de uma cultura dos valores fundamentais da integridade académica.
Orientações #2 O design da avaliação é necessário mas não suficiente para prevenir a fraude [4, 5, 6,7, 8, 9]
O desenho da avaliação pode ajudar na prevenção da fraude. Apresenta-se, na tabela seguinte, um conjunto de desafios relativos à avaliação e recomendações/sugestões que podem mitigar a problemática da fraude. Recomendações adicionais no Online learning good practice (TEQSA) [9].
Desafios | Recomendações/Sugestões |
Caraterísticas de exames que visem a avaliação da aprendizagem. | Existem instrumentos variados para avaliar online os estudantes (ver webinar no instante: 21’42’’), sendo interessante optar pelas formas que os estudantes considerarem menos apelativas em termos de cometerem fraude. |
As restrições nos processos de exame devem ser mínimas e razoáveis. | Cada restrição deve ser passível de ser aplicada com prejuízos irrisórios para a validade da avaliação. Impor demasiadas restrições pode tornar a avaliação menos segura. Por exemplo, há evidências que sugerem que restringir o tempo de provas alicia a fraude. |
Tirar partido das "restrições autênticas”, minimizando o número de restrições a respeitar numa avaliação. | Os processos e os instrumentos de avaliação podem beneficiar de restrições relacionadas com mais autenticidade das provas. A sugestão é procurar desenhar as avaliações permitindo mais autenticidade e permitir se necessário o uso de recursos tal como seriam usados em situações reais (ex: websites, colaboração entre pares...), eliminando assim benefícios da sua utilização ilícita. |
Restringir a aplicação de métodos de segurança a momentos chave, numa perspetiva “programática”. | Privilegiar as medidas de segurança da avaliação para as componentes da avaliação mais determinantes, investindo na promoção da integridade nas demais. |
Códigos de honra. | A evidência sugere que os códigos de honra influenciam os estudantes e podem diminuir a fraude em alguns aspetos específicos da fraude, mas não em todos. |
Vigilância remota de exames. | É uma componente do processo de minimização de fraude. Não deve ser aplicada por defeito, nem a todos os resultados da aprendizagem ou em qualquer circunstância. As evidências são ainda preliminares, havendo relatos de estudantes que se opõem e outros que preferem esta abordagem a exames presenciais com vigilância. Há recomendações para a sua utilização [8]. |
Importância da qualidade e da validade do instrumento/ prova de avaliação. | Aplicar medidas de vigilância em provas válidas e bem desenhadas (ao contrário de, por exemplo, provas com questões redigidas defeituosamente ou que incidam sobre aspetos não relacionados com os objetivos). |
Propor alternativas diferentes aos estudantes: equidade, diversidade e acessibilidade. | DIsponibilizar alternativas para a realização da avaliação, para prevenir problemas relacionados com a privacidade, dificuldades do acesso à rede, entre outros. As alternativas mitigam aspetos de vulnerabilidade inerentes a cada estudante, assegurando a acessibilidade a todos os estudantes. |
Orientações #3 Estabelecimento de requisitos para a segurança da avaliação [11]
Quando se pensa na segurança da avaliação deve ter-se em consideração que medidas razoáveis devem ser aplicadas. Na tabela seguinte listam-se propostas de sete requisitos, assim como as respetivas recomendações/sugestões, a serem consideradas na segurança da avaliação.
Requisito | Recomendações | Sugestões |
O que deve ser vigiado. | É impraticável vigiar tudo, nada ou de uma forma aleatória. | Vigiar as tarefas relacionadas com os resultados da aprendizagem fundamentais em cada unidade curricular/módulo. |
Garantir que o estudante é quem diz ser. | Inaceitável não tentar determinar a autenticidade das tarefas realizadas. | Solicitar um documento de identificação com fotografia; recorrer a comparações com trabalhos anteriores do estudante; conversar com o estudante sobre a tarefa realizada. |
Ter a certeza de que a tarefa foi realizada nas condições que concebemos. | Inaceitável não tentar controlar. | Em algumas tarefas pode ser necessário a vigilância com recurso a ferramentas remotas. |
Identificar se as tarefas são difíceis para o recurso à fraude. | Não deve ser assumido, sem evidências, que não é possível o recurso à fraude numa dada tarefa. | O docente deve realizar a tarefa e tentar ele próprio recorrer à fraude, ou solicitar a um colega a realização da tarefa recorrendo à fraude. |
Saber se as abordagens para a deteção da fraude funcionam. | Não deve ser assumido que todos os casos de fraude são detetados. | As abordagens devem basear-se na investigação sobre deteção da fraude. |
Existência de provas para os casos de ocorrência de fraude. | Inaceitável não haver um historial da taxa de casos de recurso à fraude, provados, sendo também inaceitável nunca ter sido detetado nenhum caso. | Os dados devem ser mantidos atualizados e as taxas de casos provados devem ser comparados com referenciais publicados. Caso haja uma discrepância muito grande, pode ser um sinal de que os casos não estão a ser detetados. |
Valores aproximados das taxas de casos não provados, provados e não detetados, como um todo. | Inaceitável não tentar comparar as taxas de casos esperados com a taxa de casos detetados. | As taxas de casos comprovados devem ser comparadas com os dados de prevalência em cursos/UC semelhantes. |
Durante o webinar com o professor Phillip Dawson, poderá encontrar diversas perguntas dos docentes sobre a temática, com respostas e sugestões que o/a poderão ajudar.
Acesso ao webinar: https://www.youtube.com/watch?v=COHAkDurLIU
Acesso aos slides:
https://www.slideshare.net/PhillipDawson3/portugal-defending-assessment-against-e-cheating-design-and-standards
Referências:
- Philip Dawson, Routledge (2021). Defending Assessment Security in a Digital World. Preventing E-Cheating and Supporting Academic Integrity in Higher Education. Capítulo 1 - “E-Cheating”, disponível: https://www.taylorfrancis.com/books/defending-assessment-security-digital-world-phillip-dawson/10.4324/9780429324178
- International Center for Academic Integrity (2021). Fundamental Values of Academic Integrity Here, 3th ed, disponível: https://academicintegrity.org/fundamental-values/
- International Center for Academic Integrity website, disponível: https://www.academicintegrity.org/
- Ellis, C., van Haeringen, K., Harper, R., Bretag, T., Zucker, I., McBride, S., . . . Saddiqui, S. (2019). Does authentic assessment assure academic integrity? Evidence from contract cheating data. Higher Education Research & Development, 1-16, disponível: https://doi.org/10.1080/07294360.2019.1680956
- Harper, R., Bretag, T., & Rundle, K. (2020). Detecting contract cheating: examining the role of assessment type. Higher Education Research & Development, 1-16. Disponível: https://doi.org/10.1080/07294360.2020.1724899
- Rundle, K., Curtis, G., & Clare, J. (2020). Why students choose not to cheat. In T. Bretag (Ed.), A Research Agenda for Academic Integrity. Edward Elgar Publishing, disponíve, https://ideas.repec.org/h/elg/eechap/19100_8.html
- Bretag, T., Harper, R., Burton, M., Ellis, C., Newton, P., van Haeringen, K., et al. (2019). Contract cheating and assessment design: exploring the relationship. Assessment & Evaluation in Higher Education, 44(5), 676-691, disponível: https://doi.org/10.1080/02602938.2018.1527892
- Case studies: Online assessment, https://teaching.unsw.edu.au/academic-integrity/case-studies
- Strategies for using online invigilated exams: https://bit.ly/3dlS4Xl
- McCabe, D. L., Treviño, L. K., & Butterfield, K. D. (2002, 2002/06/01). Honor Codes and Other Contextual Influences on Academic Integrity: A Replication and Extension to Modified Honor Code Settings. Research in Higher Education, 43(3), 357-378. https://doi.org/10.1023/A:1014893102151
Autoria: Cacilda Moura, Manuel João Costa Coordenação: Centro IDEA-UMinho Edição: Gabriel Hornink, Flávia Vieira Publicação: 26/fevereiro/2021
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